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sábado, 27 de novembro de 2010

História Encantada

Luíza foi para cama, a mãe a cobriu cuidadosamente e sentou-se ao seu lado. A menina com os olhinhos brilhantes a observava ansiosa. Por fim, a mãe começou a esperada história.
- Era uma vez...
- Mamãe?
- O que foi?
- Essa história é muito velha.
- Mas eu nem comecei a contar, você ainda não sabe de que história se trata! Como você pode dizer que ela é velha?
- Ora mamãe! A senhora disse: “era uma vez” e “era uma vez” já faz muito tempo... Eu não quero uma história que aconteceu no passado; como eu vou saber? Aposto que essas coisas nem acontecem mais...
A mãe ficou um pouco encabulada, sem saber o que fazer, afinal, todas as histórias que conhecia começavam por “era uma vez”, mas logo recuperou a compostura e mentalmente reformulou o início da narrativa, de forma que a tornasse mais contemporânea.
- Está bem. Vou começar de novo: em um belo dia de sol, a princesa passeava pelo florido jardim real, quando...
- Ah não! Não me diga que vai aparecer uma bruxa?
- Por que, Luíza?
- Porque sempre que há uma princesa feliz, em um dia bonito, num belo jardim, aparece uma bruxa e zás!
- Pois é, como você previu, Luíza, apareceu uma bruxa, feia e malvada que...
- Que enganou a princesa se fazendo passar por uma pessoa necessitada. A bobinha da princesa acreditou na conversa da megera e foi ajudá-la. Foi então que ela foi enfeitiçada.
- Parece que você já conhece essa história...
- Não, mas têm coisas que não se encaixam...
- Do que você está falando?
- Da história, é claro! Como a bruxa passou pela segurança do palácio?
A essa altura, a mãe já havia desanimado. Claro, como a bruxa passara pela segurança? Logo em um palácio, onde deve haver uma guarda treinada, alarmes de todos os tipos, câmaras de segurança... Nada entra lá sem ser visto, nem uma mosca, o que se dirá de uma bruxa disfarçada de mendiga?! Por isso era mais fácil contar a história com “era uma vez antes da invenção da segurança eletrônica”. Luíza tinha que complicar a narrativa... Mas, fazendo um esforço tremendo disse:
- A bruxa má havia feito um feitiço para que toda Guarda Real dormisse; mais do que isso, ela passou invisível pela vigilância das câmeras. Assim, ela chegou até onde estava a princesa, que ao ver a mulher maltrapilha, pedindo um prato de comida, foi ao seu encontro para ajudá-la.
- Que bom que no Brasil não há princesas; bobinhas do jeito que são, elas afundariam o país, mais do que os nossos presidentes.
- Psiu! Posso continuar?
- Sim, desculpa.
- Está bem. A princesa ficou enfeitiçada até que um belo príncipe que cavalgava por perto avistou a moça e foi ao seu encontro, para com um beijo apaixonado quebrar o encanto.
- Ta, só falta a senhora dizer que eles foram felizes para sempre.
- E eles foram felizes para sempre, mesmo!
- Como assim? Felizes para sempre? Eles não precisavam pagar contas e mais contas, ela nunca fez uma ceninha de ciúmes, ele nunca reclamou que ela ficava muito no telefone e etc e tal?
- Hum... Boa noite, Luíza, durma bem pois já está tarde demais para uma garotinha de seis anos estar acordada.
A mãe beijou a menina que já estava sonolenta com o enrolar do seu próprio pensamento, arrumou as cobertas mais uma vez e caminhou lentamente para a porta. Ao desligar a luz, ainda pensou que, não se fazem mais crianças como antigamente... Amanhã, nada de princesas, príncipes, bruxas e final feliz; a verdade, nua e crua, tirada da internet. Sorriu com carinho e falou baixinho:
- Não. Ela terá o resto da vida para o mundo real. Mesmo que ela já esteja mais esperta do que eu e não acredite mais nessas fantasias, mesmo assim, meu dever é enrolá-la por mais algum tempo...
Luíza dormia tranqüila e sonhava com um belo jardim florido e um príncipe encantado.

sábado, 13 de novembro de 2010

A ESTRADA DA VIDA

O menos promissor dos mortais é o que encara o momento em que se encontra como um degrau. E agora ligou o alarme de incêndio da maioria dos filósofos e terapeutas. Não; definitivamente, não despencou sem pára-quedas a teoria de um passo de cada vez. Apenas proponho uma visão diferente, a começar pela visualização da subida.
O presente não pode ser um degrau. Degrau é estagnado. A vida, seja qual for a situação, é fluente e, entre por o pé no próximo degrau ou cair de costas, já se modificou várias vezes, ou até mesmo passou. O agora é muito mais uma estrada, uma rampa pode ser, mas eu não vou dizer que é cheia de curvas e pedras. Cada um conhece ou vai descobrir a sua, e geralmente, para os bons caminhantes, ela é em linha reta, assim, a meta, por mais distante, sempre é visível.
O degrau, o qual você acha que se encontra neste momento, é apenas um vão entre outros dois absolutamente iguais. É pouco. Se esse é o seu presente, é muito pouco! O presente é a única coisa que você possui. O oásis que esperas encontrar no topo, talvez não chegue, ou talvez você não mereça por não ter enfeitado sua alma com as flores que lhe eram oferecidas pelo caminho que percorrestes. Mas que flores, se não vistes nem a estrada? Onde ficam as cores no apertado e vazio degrau que insistes em arquitetar? Será mais divertido enfrentar a tudo como uma caminhada; a filosofia é a mesma, mas o horizonte é muito maior, e sempre tem o pôr- do -sol.
O problema da tradicional escada, repleta de degrauzinhos, é o medo de altura. Não é por nada que apenas os corajosos, ousados e alguns aventureiros, conseguem chegar ao degrau mais alto, à vitória, ao sucesso. Para a maioria, a subida é temerosa, e tanto olhar para cima, como para baixo, dá vertigem. O que fazem, então? Agarram-se com força ao que têm, não se mexem, e acabam transformando o degrau temerário em sua morada. Já, uma estrada, não é isenta de perigos, mas na hora do medo, permitirá a você correr para algum lugar, e o simples fato de andar, seja para frente, ou para trás, transforma. A estrada é mais democrática: permite ao destemido e ao fóbico chegar.
Então, que “passado” não seja o único verbo de movimento na sua vida. Valorize o seu presente, extraindo dele tudo o que for possível. Não espere ansiosamente por um grande final, esquecendo que a sua vida é agora! Torne seu dia, hoje,parecido com o que você sonha para daqui um, cinco, vinte anos, pois você já possui quase tudo o que precisa; só falta o certificado de aprovação na escola da vida, oferecido àqueles que souberam extrair dela o código secreto para o desfecho feliz. Boa caminhada.    

sábado, 6 de novembro de 2010

Epidemia

Mariana viu na televisão uma boneca Barbie e imediatamente se apaixonou por ela (meninas se apaixonam fácil). Mariana chorou, sapateou, esperneou até que ganhou a sua Barbie.
As amigas de Mariana adoraram a boneca; adoraram tanto que quiseram uma igualzinha para cada uma e, tão logo as ganharam, suas primas também descobriram que não poderiam viver sem a Barbie.
A dona da loja de brinquedos da cidade acabou percebendo a importância da boneca para as meninas e percebeu que a Barbie, devido toda a sua importância, merecia um preço mais “adequado”, afinal, que garota cresce isenta de traumas sem uma Barbie? Os preços subiram, mas as meninas continuaram enlouquecidas a comprar a tal boneca.
A mãe da Taís comprou de uma só vez, cinco bonecas (conseguiu um descontão!) e as deu para sua filha e sobrinhas.
Em pouco tempo, já havia mais Barbie na cidade do que pessoas.
Certa vez, Danny pegou catapora (crianças adoecem com freqüência). Danny chorou, sapateou, esperneou, mas nada podia ser feito: era catapora e não havia outro remédio se não repousar.
Danny já se sentia bem, então foi à escola; porém, depois de alguns dias seus amigos também pegaram catapora. A doença é tão contagiosa que os familiares dos amigos do Danny, que ainda não haviam pegado, pegaram. Até a dona da loja de brinquedos teve que ficar de cama!
A mãe do Juca também pegou e passou a doença para no mínimo cinco pessoas, inclusive o pobrezinho do Juca.
A doença se espalhou e, em pouco tempo, a cidade toda estava com catapora.
Pois bem! Não é preciso dizer que o consumismo, assim como a catapora é uma epidemia e, mais do que isso, as crianças são as mais vulneráveis, não é? Mas fazer o que: só se pega catapora uma vez; só se tem disposição para brincar de boneca por um curto espaço de tempo. Éramos felizes e nem sabíamos! Doces lembranças da infância...