Planejava começar dizendo que nada me enfurece mais do que esperar em fila de banco, mas os acontecimentos que vêm a seguir me obrigam a objetar. Recomeço. Nada é pior do que esperar em fila de banco onde uma televisão está ligada em um canal de desenho animado; desenho formato chinês. Nada é pior do que desenho chinês...
Seguimos, para não sermos comparados a filas de banco. Estava em meu horário de almoço, esperando em uma fila de banco, a pedido de meu chefe. O tempo era a única coisa que andava. Fome. Misto de raiva consciente incontida e fúria inconsciente controlada. Nessas horas, alguém da fila sempre puxa conversa, talvez para passar o tempo, talvez para socializar o sofrimento. Nada me enfurece mais do que isso. Não! Tem uma coisa que me incomoda mais: ser essa pessoa.
Cento e dois, cento e três, a minha ficha era a de número cento e cinco. Estava quase e só tinha uma certeza: chegaria atrasada no trabalho. Deveria estar feliz; não estava! Perderia meio dia de trabalho, apenas no desconto do salário.
Uma simpática velhinha (parecia saída de um filme de Hollywood) pediu-me se não poderia passar na minha frente, afinal, só precisava receber, seria coisa rápida. Não lhe dei resposta. Meu olhar estava atento em algo, talvez no chamar das senhas; não, era no desenho mesmo.
Cento e cinco. Era eu. Dirigi-me ao caixa e disse que deixaria a senhora passar na minha frente. A atendente disse algo como “que bela atitude”, não sei, não ouvi. O que são cinco minutos para quem já está atrasado? Para quem está com fome e não tem solução para seus problemas?
Deveria ter suspeitado. Ela era cinematográfica demais. Saída de uma comédia americana. Cena clássica: a bondosa velhinha retira da bolsa um saquinho de moedas e começa a contar, uma a uma, perde a conta e recomeça... Não foi bem assim, mas quase. A senhora continha uma réstia de documentos que eram solicitados um de cada vez; por fim, ela precisava da assinatura de um de seus filhos e saiu do banco para buscá-lo. Eu, esperando...
Mas, sabe que tirando a quarta-feira de cinzas, o resto é carnaval. Tudo acaba bem! Depois da senhorinha eu fui prontamente atendida. Ganhei um sorriso amável de agradecimento. Ganhei o meu dia, apenas por esperar. E olha que isso é muito! Quantas vezes esperamos em filas quilométricas, assistindo a desenhos chineses, falando com desconhecidos apenas por falar, e não recebemos nada em troca, um ou outro aborrecimento. Era para ser um texto “fila de banco”: mal-humorado, sobre coisas que ódio; virou um olhar terno: comédia e coisas que eu quero para sempre.
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